segunda-feira, novembro 29, 2010

Sem mudanças, emissões de gás carbono podem subir 40%

Alerta foi feito pelo relator da ONU sobre o Direito à Alimentação, Olivier de Schutter, aos participantes da Conferência sobre Mudança Climática, aberta em Cancún, no México. O relator especial das Nações Unidas sobre o Direito à Alimentação, Olivier de Schutter, disse que sem mudanças importantes em políticas agrícolas, as emissões de gases nocivos poderão subir 40% até 2030. A declaração foi feita aos negociadores da Convenção sobre Mudança Climática, em Cancún, no México.

Negociações

De Schutter disse que o evento deve levar ao que ele chamou de um "Plano Marshall" da agricultura. Segundo o relator, as negociações no país latino-americano são vitais para garantir o direito à comida de milhões de pessoas. De acordo com dados das Nações Unidas, rendimentos de campos agrícolas regados pelas chuvas podem ser reduzidos pela metade até 2020. As regiões semi-áridas também poderiam crescer em até 90 milhões de hectares no mesmo período. Estas mudanças levariam cerca de 600 milhões de pessoas ao risco de passar fome. O relator da ONU lembrou que a agricultura é responsável por 14% das emissões de gases que causam o efeito estufa, e que são causadas por seres humanos. No próximo ano, Olivier de Schutter deverá apresentar um relatório ao Conselho de Direitos Humanos com propostas sobre agricultura sustentável.

Fonte: Rádio ONU em Nova York, Mônica Villela Grayley, 29/11/2010.

sexta-feira, novembro 26, 2010

Uso de agrotóxicos, mortandade de pássaros e dano ambiental

O MP estadual, recorrido, ajuizou, na origem, ação civil pública em desfavor da empresa agrícola, recorrente, sob a alegação de que essa seria responsável por dano ambiental por uso de agrotóxico ilegal, o que teria causado grande mortandade de pássaros. A recorrente, em contestação, entre outras alegações, sustentou a descaracterização do mencionado dano, arguindo que pouco mais de trezentas aves teriam morrido, sem que tenha havido efetivo comprometimento do meio ambiente.

A sentença julgou procedente a ação, condenando a recorrente a pagar a importância de R$ 150 mil em indenização a ser revertida para o meio ambiente local, em recomposição do dano ambiental causado com a morte de 1.300 pássaros da fauna silvestre, o que se manteve em grau de apelação. Nesta instância especial, ao apreciar a controvérsia, consignou o Min. Relator que a existência de um dano ambiental não só encerra a necessidade de reconstituição do meio ambiente no que for possível, com a necessária punição do poluidor (princípio do poluidor-pagador), mas também traz em seu bojo a necessidade de evitar que o fato venha a repetir-se, o que justifica medidas coercitivas e punições que terão, inclusive, natureza educativa. Observou não haver como fracionar o meio ambiente e, dessa forma, deve ser responsabilizado o agente pela morte dos pássaros em decorrência de sua ação poluidora.

Quanto ao valor estabelecido na condenação, entendeu que o pleito da recorrente para que se tome como base de cálculo o valor unitário de cada pássaro não pode prosperar, já que a mensuração do dano ecológico não se exaure na simples recomposição numérica dos animais mortos, devendo-se também considerar os nefastos efeitos decorrentes do desequilíbrio ecológico em face da ação praticada pela recorrente. Diante desses fundamentos, entre outros, a Turma negou provimento ao recurso.

Precedentes citados: REsp 1.120.117-AC, DJe 19/11/2009, e REsp 1.114.893-MG. REsp 1.164.630-MG, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 18/11/2010.

terça-feira, novembro 23, 2010

Reforma do Código Florestal reduzirá estoques potenciais de 7 bi de toneladas de carbono

As mudanças no Código Florestal provocariam acréscimo nas emissões brasileiras. Brasília, 23 de novembro de 2010 - Dados preliminares de estudo do Observatório do Clima estimam que, se forem aprovadas as alterações no Código Florestal conforme o substitutivo proposto pelo deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), há um risco potencial de quase 7 bilhões de toneladas de carbono acumuladas em diversos tipos de vegetação nativa a serem lançadas na atmosfera. Isto representaria 25,5 bilhões de toneladas de gases do efeito estufa, mais de 13 vezes as emissões do Brasil no ano de 2007.

Um dos dispositivos propostos no Projeto de Lei 1876/99 que altera o Código Florestal trata da isenção de manter e recuperar a reserva legal em pequenas propriedades rurais (até quatro módulos fiscais). A isenção também se aplica ao equivalente a quatro módulos em grandes e médias propriedades. Tal medida é a que tem maior impacto potencial nas emissões de gases do efeito estufa e deixaria uma área total de 69,2 milhões hectares sem proteção da reserva legal, área maior que o estado de Minas Gerais.

Segundo o levantamento do Observatório do Clima, o estoque potencial estimado de carbono nestas áreas é de 6,8 bilhões de toneladas, correspondendo a um volume de gases do efeito estufa de 25 bilhões de toneladas de CO2eq (gás carbônico equivalente).

Uma segunda modificação importante prevê a redução de 30 metros para 15 metros na área de preservação de matas ciliares em rios com até 5 metros de largura. Esta mudança faria com que os seis biomas brasileiros deixassem de estocar 156 milhões de toneladas de carbono, correspondendo a mais de 570 milhões de toneladas de CO2eq, numa área de 1,8 milhão de hectares, o equivalente a mais de 2 milhões de campos de futebol.

De acordo com André Ferretti, coordenador do Observatório do Clima, o estudo contempla apenas uma das diversas facetas das propostas de modificação do Código Florestal. “Com a aprovação do texto, a meta do Brasil de reduzir as emissões nacionais de gases causadores do aquecimento global viraria pó, além dos inúmeros impactos causados à biodiversidade”, avalia.

As modificações podem comprometer gravemente a meta brasileira de redução de emissões estipulada na Política Nacional de Mudanças Climáticas. O Brasil assumiu ano passado, em Copenhague, o compromisso de cortar aproximadamente 1 bilhão de toneladas de suas emissões de gases no ano de 2020.

Metodologia: O estuudo  foi elaborado conforme as metodologias do Good Practice Guidance for Land Use, Land-Use Change and Forestry, do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima – IPCC (IPCC, 2003) e também de acordo com o Segundo Inventário Brasileiro de Emissões e Remoções Antrópicas de Gases de Efeito Estufa, divulgado em outubro pelo ministério da Ciência e Tecnologia. O território nacional foi subdividido em unidades espaciais na forma de polígonos que resultaram da integração das seguintes fontes de dados sobre Bioma (IBGE, 2004), Limites municipais (Malha Municipal Digital 2005 do IBGE), Fisionomia vegetal (IBGE, 2004) e Tipo de solo (EMBRAPA/IBGE, 2003).

Fonte: WWF-Brasil, 23/11/2010.

quinta-feira, novembro 18, 2010

Acre cria lei para que moradores recebam pela conservação da floresta

O Acre agora tem uma lei para viabilizar que a população seja beneficiada financeiramente com a conservação da floresta. Ela cria o Sistema de Incentivo a Serviços Ambientais, que permitirá que investidores estrangeiros paguem ao estado para compensar emissões de carbono feitas em seus países de origem. O Acre tem 88% de sua superfície coberta por floresta.
O governo do Acre deve assinar ainda esta semana um acordo com o da Califórnia que compatibilize a legislação dos dois estados. Esse tipo de compensação é conhecido como Redd (sigla para redução de emissões por desmatamento e degradação) e, basicamente, consiste na criação de mecanismos que permitam que países desenvolvidos paguem àqueles em desenvolvimento para que conservem suas florestas para suprir as emissões de carbono de suas economias industrializadas.
Para o país rico, é vantajoso pagar pela conservação numa região pobre, pois acaba sendo mais barato que reduzir as emissões localmente. Para os países em desenvolvimento, como o Brasil, há a vantagem de receber dinheiro e conservar seu patrimônio ambiental.
No caso do Acre, a nova lei, que foi aprovada pela Assembleia Legislativa e sancionada pelo governo na última quinta-feira, prevê formas diferenciadas para que os diferentes grupos que habitam o interior do estado recebam os recursos. Segundo informações da Secretaria do Meio Ambiente, cada comunidade elegeu a forma como gostaria de ser beneficiada.
Desta forma, as terras indígenas, por exemplo, podem receber bens comuns, como a construção de escolas, enquanto grandes proprietários de terra poderão obter valores diretamente em dinheiro. Outros segmentos, como os ribeirinhos e os grupos extrativistas (por exemplo, seringueiros e coletores de castanhas) também devem ser contemplados.

Dano ambiental e cumulação de pedidos

Consoante orientação do STJ brasileiro, na ação civil pública ambiental, é possível cumular os pedidos de obrigação de fazer (reflorestar a área degradada) e de pagamento de indenização pecuniária em razão do dano material causado. As questões de direito ambiental são usualmente resolvidas nas Turmas que compõem a Primeira Seção deste Superior Tribunal. Contudo, quando a discussão limita-se à responsabilidade civil do particular pela reparação do dano ambiental, a competência para julgamento é das Turmas integrantes da Segunda Seção (art. 9º, § 2º, III, do RISTJ).

Precedente citado: REsp 1.181.820-MG, DJe 20/10/2010. REsp 1.173.272-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 26/10/2010 (ver Informativo n. 450).

quinta-feira, novembro 11, 2010

"Crise no sector da pecuária: PE apela à introdução urgente de mecanismos de mercado"

De acordo com o respetivo Serviço de Imprensa, "O Parlamento Europeu exortou hoje a Comissão a fazer uso dos mecanismos de mercado para mitigar a actual crise no sector da carne de suíno e noutros sectores da pecuária.
Um grande número de explorações pecuárias da UE encontra-se de momento seriamente ameaçado por uma combinação de factores, como os custos crescentes dos meios de produção (combustíveis e fertilizantes), os custos elevados inerentes ao cumprimento da regulamentação da UE, uma maior concorrência das importações de países terceiros, o recente aumento dos preços dos cereais e os baixos preços obtidos pelos agricultores para os produtos à base de carne.
Numa resolução hoje aprovada em plenário os eurodeputados avançam com uma série de recomendações para melhorar a situação."

Este Comunicado está disponível, na íntegra, nas Línguas Portuguesa, Espanhola e Italiana.

quarta-feira, novembro 10, 2010

Mestrado em Direito Agroambiental

A Coordenação do Programa de Pós-Graduação em Direito Agroambiental, da Faculdade de Direito da UFMT, comunica a abertura de inscrição para o preenchimento de até 15 vagas, nível Mestrado, no Programa de Pós-Graduação em Direito Agroambiental, nas linhas de pesquisa Direito Agrário e Direito Ambiental.
PERÍODO DE INSCRIÇÃO: 16/11/2010 a 30/11/2010, das 08h às 11h e das 16h às 20h.
LOCAL: Secretaria do Faculdade de Direito da UFMT.
Para completas informações, acesse o Edital n. 2/2010.

Novidade Editorial


Direito Socioambiental - Volume II - Em Homenagem ao Professor Vladimir Passos de Freitas

Coordenadora: Alessandra Galli, 442 pgs. Editora: Juruá Editora ISBN: 978853623115-0

SUMÁRIO DA OBRA:
FLORESTAS, MUDANÇAS CLIMÁTICAS, COTAS DE RESERVA FLORESTAL, CRÉDITOS DE CARBONO, MANEJO FLORESTAL, AGROBIODIVERSIDADE E PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO CULTURAL, PAGAMENTO POR SERVIÇOS AMBIENTAIS E MECANISMOS DE MERCADO PARA O CONTROLE DA POLUIÇÃO

MATA ATLÂNTICA E SUA UTILIZAÇÃO Guilherme José Purvin de Figueiredo

MUDANÇAS CLIMÁTICAS E REFUGIADOS AMBIENTAIS SOB A ÓTICA DA SOCIEDADE INTERNACIONAL Alessandro Panasolo e Patricia Helena Daher Lopes

MUDANÇAS CLIMÁTICAS - MUDANÇAS HUMANAS Cristiane Derani

COTAS DE RESERVA FLORESTAL (CRF): ALTERNATIVA ECONÔMICA FRENTE À CRISE SOCIOAMBIENTAL Saulo Gomes Karvat

PROJETOS PARA GERAÇÃO DE CRÉDITOS DE CARBONO E SEU POTENCIAL PARA CONTRIBUIÇÃO AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NO BRASIL Marcelo Leoni Schmid

MANEJO FLORESTAL YANOMAMI: CONVERGÊNCIAS COSMOLÓGICAS, CULTURAIS E DE SUSTENTABILIDADE COM SUPORTE CONSTITUCIONAL NO ESTADO BRASILEIRO Edson Damas da Silveira

A AGROBIODIVERSIDADE, OS INSTRUMENTOS JURÍDICOS DE PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO CULTURAL E O SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA (SNUC) Juliana Santilli

A COMPENSAÇÃO E A GRATIFICAÇÃO POR SERVIÇOS AMBIENTAIS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA Erika Bechara

CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE O PAGAMENTO POR SERVIÇOS AMBIENTAIS COMO UM INSTRUMENTO ECONÔMICO PARA A CONSERVAÇÃO DAS ÁGUAS, FLORESTAS E DA BIODIVERSIDADE Daniela Roberta Slongo

ASPECTOS JURÍDICOS DOS MECANISMOS DE MERCADO COMO INSTRUMENTOS AUXILIARES DE POLÍTICAS DE CONTROLE DA POLUIÇÃO Rômulo Silveira da Rocha Sampaio
ÁGUAS, SAÚDE AMBIENTAL, HIDRELÉTRICAS E POLUIÇÃO MARINHA

A MIOPIA DAS POLÍTICAS DE RECURSOS HÍDRICOS BRASILEIRAS NA GESTÃO DAS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS Gabriel Gino Almeida

SAÚDE AMBIENTAL: A ÁGUA TRATADA COMO DIREITO À VIDA ATRAVÉS DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO SIMBÓLICA Luiz Rodrigo Grochoski

HIDRELÉTRICAS E MATAS CILIARES Adyr Sebastião Ferreira

O CASO DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE NO ENTORNO DE RESERVATÓRIOS DE GRANDES USINAS HIDRELÉTRICAS NO ESTADO DO PARANÁ: DIREITO ADQUIRIDO DE POLUIR VERSUS DIREITO FUNDAMENTAL À DESAPROPRIAÇÃO PRÉVIA E JUSTA Rafael Ferreira Filippin e Robertson Fonseca de Azevedo

POLUIÇÃO MARÍTIMA E A QUESTÃO DA COMPETÊNCIA Dario Passos de Freitas
SUSTENTABILIDADE ECOLÓGICA, ECONÔMICA E SOCIAL NA REALIDADE BRASILEIRA, DANO E REPARAÇÃO AMBIENTAL, CIDADES, SANEAMENTO BÁSICO, UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA EM ÁREAS HABITADAS, MEIO AMBIENTE, RESÍDUOS SÓLIDOS, GESTÃO DOS RISCOS URBANOS, CATADORES E RESPONSABILIZAÇÃO EMPRESARIAL

OS DESAFIOS À CONSTRUÇÃO DA SUSTENTABILIDADE ECOLÓGICA, ECONÔMICA E SOCIAL NA REALIDADE BRASILEIRA E O PAPEL DOS MÚLTIPLOS ATORES Consuelo Y. Moromizato Yoshida

DANO AMBIENTAL Eliana Calmon

REPARAÇÃO TOTAL Fabiano Neves Macieywski

FALANDO SOBRE SANEAMENTO BÁSICO Luciana Cordeiro de Souza

A CRIAÇÃO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA EM ÁREAS HABITADAS: PROBLEMÁTICA E SOLUÇÕES POSSÍVEIS Marcelo Buzaglo Dantas

RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS: BREVES CONSIDERAÇÕES Saint-Clair Honorato Santos

AS CIDADES, O LIXO E A GESTÃO DOS RISCOS URBANOS: DESAFIOS PARA A EFETIVIDADE DO DIREITO AMBIENTAL Karin Kassmayer

INSERÇÃO SOCIAL DOS CATADORES E A RESPONSABILIZAÇÃO EMPRESARIAL Margareth Matos de Carvalho

Maiores informações e aquisição aqui.

sexta-feira, novembro 05, 2010

Resgate de Selvas Sem Salvaguardas Sociais

        Em reportagem de Matthew Berger, da IPS, Washington, Estados Unidos, em 4/11/2010 , indicou que vários países preparam planos para frear o desmatamento como forma de compensar a mudança climática mundial, uma iniciativa muito divulgada pela Organização das Nações Unidas (ONU) e pelo Banco Mundial. A pergunta do milhão é quem cuidará para que sejam aplicadas as normas sociais e ambientais. Em alguns lugares, particularmente na Indonésia, não está claro se serão adotadas essas políticas, conhecidas como salvaguardas.

Aprovado o mecanismo REDD (Redução de Emissões de Carbono Causadas pelo Desmatamento e pela Degradação das Florestas), os países mais ricos pagarão para manter florestas tropicais como forma de compensar suas emissões de carbono, o principal gás que provoca o aquecimento global. Deste modo, essas nações obteriam “créditos de carbono” que as ajudariam a cumprir seu compromisso de reduzir os gases responsáveis pelo efeito estufa.

       Sob o REDD, acordado nas reuniões sobre mudança climática realizadas em 2007 na Ilha de Bali, na Indonésia, foram criadas várias iniciativas para distribuir os fundos que seriam entregues pelos doadores aos beneficiários. Entre eles o Programa REDD-ONU e dois do Banco Mundial: Fundo Cooperativo para o Carbono das Florestas (FCPF) e Programa de Investimento Florestal (FIP).
       Os órgãos diretores dessas três iniciativas se reunirão no dia 6 em Washington para discutir como dirigir o apoio às estratégias nacionais do REDD. Esta semana já aconteceram algumas reuniões entre participantes e observadores no FCPF. Nesses encontros, um tema álgido foi a proposta do Banco Mundial de permitir que outras instituições multilaterais se associem em sua tarefa de canalizar os fundos do REDD para os países em desenvolvimento.
       A proposta complicará ainda mais uma já caótica rede de instituições que atuam como intermediárias entre os que pagam e os que cumprem a conservação florestal sob mandato do REDD. Mas, representantes de organizações não governamentais parecem concordar com a ideia, desde que não aprofunde muitos os problemas potenciais que já enfrentam os programas do REDD. A principal maneira de fazê-lo é incluir nas políticas salvaguardas que garantam o cumprimento de certos padrões sociais e ambientais.
        Atualmente, o Banco Mundial tem uma forte política de salvaguardas. Alguns líderes de organizações não governamentais que participaram esta semana das reuniões do FCPF temem que outras instituições não possam replicar esse modelo. Se isto não acontecer, a proposta pode fazer com que um país do REDD se veja tentado a escolher a agência com os padrões mais baixos em matéria de salvaguardas como sua sócia para o financiamento, disse Susanne Breitkopf, assessora para políticas florestais no Greenpeace.
       O diretor de campanhas do Bank Information Center (BIC), Mark Rentschler, disse que é muito raro os países – especialmente os do REDD – terem salvaguardas tão fortes como as do Banco Mundial, e que colocá-las em prática é todo um desafio para eles. Contudo, têm de cumpri-las porque algumas das atividades previstas sob o REDD podem prejudicar comunidades e até o meio ambiente, afirmou.
       Este é particularmente o caso da Indonésia, onde no passado o governo desalojou comunidades indígenas, entre outras, de áreas florestais destinadas à conservação, ou inclusive concedidas para empreendimentos mineradores ou plantações. Como ocorreu em outros países da Ásia, América Latina e África, terras que pertenciam a comunidades originárias, dentro ou perto de áreas florestais, foram destinadas a outros interesses sem prévia consulta.
        Um motivo para essa violação de direitos é a falta de salvaguardas para proteger essas comunidades nos códigos legais nacionais, problema que tem de ser abordado na medida em que os países continuam defendendo suas políticas no contexto REDD. Isto afirma um estudo apresentado ontem em Washington por uma coalizão de organizações indígenas e da sociedade civil.
         A Indonésia, que recebe US$ 3 bilhões a título de preparativos do REDD, divulgou um projeto de estratégia para implementar este mecanismo em setembro, mas o texto foi criticado por não ir muito longe na abordagem de questões de governança e salvaguardas. “Como este dinheiro flui para o governo, o problema é a falta de mecanismos necessários para criar, administrar e liberar o dinheiro que está entrando”, disse Jelson García, que coordena desde Manila o trabalho do BIC no sudeste da Ásia.
      “A Indonésia tem um papel muito importante no tocante à mitigação da mudança climática, particularmente em referência ao papel das florestas. E o que acontece na Indonésia em matéria de planejamento do REDD, na realidade, pode ser aplicado a todos os demais países que têm projetos sob o REDD”, afirmou. Nos últimos anos, a Indonésia se converteu no terceiro maior emissor de gases-estufa, em boa parte devido ao desmatamento e à degradação de seus mangues.
       Quase 20% das emissões contaminantes relacionadas às atividades humanas no mundo têm origem no desmatamento. A partir de janeiro próximo, uma moratória de dois anos no corte de florestas na Indonésia deterá o avanço de alguns cultivos no país, em troca de um fundo de US$ 1 bilhão que será entregue pela Noruega. A Indonésia atravessa “um momento muito importante”, disse Susanne citando esta moratória.

terça-feira, novembro 02, 2010

Crédito fundiário: reforma agrária de mercado ou instrumento salvaguarda da agricultura familiar?

A política de crédito fundiário pode se transformar numa intervenção do Estado mais ambiciosa, que não se limite a ações pontuais e complementares de um programa de reforma agrária via desapropriação ou aquisição de imóveis rurais improdutivos.
Ademir Cazella
Professor do Programa de Pós-graduação em Agroecossistemas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Pesquisador do Observatório de Políticas Públicas para a Agricultura (OPPA).
Se é verdade que o rural não é sinônimo de agrícola, nem de atraso, não se pode negligenciar o lugar de destaque que a agricultura ocupa na economia nacional e, em particular, nas regiões rurais do país. No entanto, a persistência de segmentos sociais subjugados a relações de produção atrasadas – a exemplo de parcela importante de agricultores familiares que trabalham como arrendatários e parceiros, ou ainda atuando parte do tempo como assalariados agrícolas sazonais – mantém na ordem do dia a premência de políticas públicas que busquem equacionar o acesso precário à terra de parte de milhões de famílias de agricultores.
A tese defendida neste artigo é que a política de crédito fundiário pode se transformar numa intervenção do Estado mais ambiciosa, que não se limite a ações pontuais e complementares de um programa de reforma agrária via desapropriação ou aquisição de imóveis rurais improdutivos. No Brasil, o acesso à terra via crédito fundiário enfrenta dificuldades de várias ordens, mas duas delas são, sem sombra de dúvida, as mais relevantes: i) resistências de cunho ideológico; ii) falta de tradição e de bases técnicas das principais agências públicas de desenvolvimento rural nessa área de intervenção. Nosso propósito é apresentar alguns elementos relacionados ao enfrentamento da primeira das dificuldades acima mencionadas, buscando dialogar, de forma especial, com lideranças sociais, gestores de políticas públicas e pesquisadores do tema da reforma agrária, que rechaçam a ideia de um programa contundente de crédito fundiário, alegando se tratar de uma política de mercado e, portanto, de cunho neoliberal, de direita e conservadora.
A defesa de uma política de crédito fundiário tem se deparado no Brasil com uma forte resistência de organizações políticas envolvidas na luta pela terra. Uma operação dessa natureza é percebida por tais organizações como um mecanismo de desmobilização política dos movimentos sociais que reivindicam a reforma agrária. Além disso, o aprofundamento dessa política esbarra, também, na resistência à mudança de instituições públicas que atuam com o tema, em especial do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária.
Apesar dessas resistências, torna-se difícil não reconhecer a necessidade, nem as potencialidades de ações que busquem reorganizar as estruturas agrícolas e, de forma mais ampla, o território. Uma política de crédito fundiário concebida como instrumento de reforma agrária associado à concepção de ordenamento territorial tem o papel principal de salvaguardar o caráter familiar da agricultura, assegurando a sucessão de unidades agrícolas familiares colocadas à venda por razões diversas, aumentando o tamanho de estabelecimentos rurais considerados minifúndios e atuando no redesenho de unidades de produção agrícola. Nos estados de colonização antiga, os processos sucessórios e as restrições impostas pela legislação ambiental tornaram muitas dessas unidades inadequadas em face do atual contexto socioeconômico e ambiental. Na maioria desses estados, as fronteiras agrícolas encontram-se esgotadas e a desapropriação de áreas para fins de reforma agrária esbarra nos limites impostos pela legislação, ou ainda pela forma como as leis agrárias têm sido interpretadas.
Outra constatação refere-se ao fato de que uma parcela significativa de unidades agrícolas familiares enfrenta o dilema de não ter um sucessor. O caso de Santa Catarina é ilustrativo a esse respeito. Segundo o Levantamento Agropecuário Catarinense realizado em 2001, cerca de 21% (um quinto) dos estabelecimentos rurais encontravam-se nessa situação. A essa cifra deve-se adicionar os agricultores familiares que, por motivações diversas, vendem a totalidade ou parte de seus estabelecimentos. Que destino vem sendo dado a essas unidades? A maioria é adquirida por empresários locais que investem, preferencialmente, em reflorestamentos com espécies exóticas, ou em pastagens para criação de gado. Ou seja, a maioria desses estabelecimentos perde o caráter familiar e se transforma ou é agregado a empresas agropecuárias.
Outra indicação de que em estados de colonização antiga a política de reforma agrária tradicional enfrenta dificuldades para sua execução de forma mais abrangente, seja por limitações operacionais, seja por resistência de forças políticas que se opõem à sua implementação, é dada pela comparação dos resultados da atual política de crédito fundiário com os da política de reforma agrária via desapropriação. Novamente o caso de Santa Catarina é ilustrativo . Num mesmo período de tempo (1983-2009), o assentamento de agricultores pela política de reforma agrária beneficiou cerca de 5,6 mil famílias (28,7%), enquanto o crédito fundiário, via os programas Fundo de Terras, Banco da Terra e Programa Nacional de Crédito Fundiário (PNCF), possibilitou o acesso à propriedade da terra a 13,9 mil famílias (71,3%).
As ações fragmentadas e pontuais empreendidas pelo atual programa de crédito fundiário contrastam com a necessidade de se elaborar planos regionais de ordenamento territorial e fundiário por Sociedades de Ordenamento Territorial e Fundiário, dotadas do direito de preferência de compra de terras. A partir dos cadastros de imóveis rurais, a elaboração desses planos exigiria a identificação dos estabelecimentos rurais com problemas de sucessão, em regime de posse, vulneráveis do ponto de vista econômico e ambiental e excessivamente fragmentados ou mal “desenhados”.
As experiências de países onde Sociedades dessa natureza foram constituídas revelam que elas desempenham um papel estratégico no desenvolvimento territorial sustentável. Dotadas de um profundo conhecimento do mercado regional de terras, essas experiências ensinam, também, que a operacionalização de uma política de ordenamento territorial e fundiário, além de conhecimento técnico específico, implica uma grande disposição e um elevado grau de competência da parte de profissionais, atores sociais e organizações territoriais na arte de mediação de conflitos.
Na França, por exemplo, existe um sistema de regulação dos mercados fundiários, através da atuação conjunta do Estado e das organizações profissionais agrícolas, pouco conhecido fora das fronteiras daquele país. As Sociedades de Ordenamento Fundiário e de Estabelecimento Rural (SAFER) têm como missão melhorar as estruturas agrícolas, aumentar a superfície de certas unidades de produção e facilitar a instalação de novos agricultores.
Trata-se de sociedades anônimas sem fins lucrativos geridas por um conselho de administração, que reúnem diversos acionistas: bancos e cooperativas de crédito agrícola, coletividades locais e organizações profissionais agrícolas. A instância de decisão interna é constituída por uma comissão paritária entre representantes do Estado e da profissão agrícola, esta última representada pelo segmento sindical.
Essas Sociedades estão habilitadas a adquirir, trocar ou revender terras num prazo de cinco anos. A atribuição do direito de preempção permite que as SAFER definam quem será o comprador de terras agrícolas colocadas à venda no território que elas administram. A essa preferência de compra acrescenta-se a possibilidade de fixar o valor da terra com base nos preços históricos, mesmo que outros compradores estejam dispostos a pagar um montante maior. Para que isso possa funcionar, qualquer venda de terras agrícolas deve ser objeto de uma notificação à SAFER. Essa obrigatoriedade de informação faz dessa instituição um observatório privilegiado do mercado fundiário, permitindo agir contra a especulação fundiária.
Mesmo que haja controvérsias entre estudiosos do desenvolvimento rural daquele país sobre a eficácia dessa estrutura em relação aos seus propósitos originais, o fato é que as SAFER estão presentes em todo o território francês por meio de uma organização descentralizada e integram o leque de instituições que atuam no processo de gestão do desenvolvimento rural. Sua história de intervenção, fragilidades, contradições, limitações e, principalmente, conhecimento técnico acumulado pode servir de referência para o aprimoramento da atual política de crédito fundiário no Brasil.
Além de atuar na estrutura dos estabelecimentos rurais, essa política permite a articulação com a gestão de unidades de conservação ou espaços naturais protegidos, a criação de corredores ecológicos, o planejamento do uso não agrícola de áreas rurais e da infraestrutura do meio rural. Abre-se aqui um vasto campo de intervenção para que se associe as ações públicas de acesso à terra no meio rural com aquelas do Sistema Nacional de Unidades de Conservação e com o debate atual sobre os temas da pluriatividade agrícola e das ocupações rurais não agrícolas.
Sem isso, corre-se seriamente o risco de que a atual política de crédito fundiário, tal como vem sendo conduzida, fique à mercê de práticas políticas clientelistas e dissociada de iniciativas empreendidas por diversas organizações sociais e públicas sobre o tema do desenvolvimento territorial sustentável. Nesse sentido, chama a atenção de quem acompanha a agenda de atividades sobre esse assunto a ausência de representantes da Secretaria de Reordenamento Agrário do Ministério do Desenvolvimento Agrário (SRA/MDA) nesse debate. Associado a isso, percebe-se a inexistência de mobilização por parte de organizações representativas e de apoio à agricultura familiar no sentido de imprimir um maior controle social em relação à política de crédito fundiário. Isso implicaria necessariamente reivindicar maior peso político para a SRA no interior da estrutura do MDA, já que nesse Ministério é ela a Secretaria com maiores fragilidades em termos de expressão política, quadro de pessoal e infraestrutura.
Fonte:
Carta Maior.